2.3.06

uma coisa em forma de chá

«Bebe-se chá para esquecer o bulício do mundo», murmurava T'ien Yi-Heng muito antes de a sua paixão, mais exigente do que a do ouro, segundo se diz, ser partilhada por apreciadores dos quatro cantos do mundo.
Bebida única, o chá é celeste por nascimento: as suas primeiras gotas, diz a lenda, humedeceram os lábios divinos do imperador Chen Nung.
Mas o seu segredo reside, sem dúvida, em algo mais: nas suas qualidades quase humanas. O chá relata, convida à viagem, é partilhado, aproxima as culturas, dá-se aos poetas, é desde logo gesto de hospitalidade e de convívio. Nenhum outro produto da terra suscitou, ao longo dos séculos, rituais tão subtis, ou inspirou um refinamento igual ao dos objectos que o servem.

Desde que foi descoberto e até ao início do século XVII, o chá permaneceu desconhecido do Ocidente e apanágio quase exclusivo da China. O seu cultivo só timidamente se evade para os limites do país: a Coreia, o Tibete, o Japão foram os primeiros a receber os seus benefícios. Foram os oásis e caravanas da rota da seda que albergaram os primeiros marcos de uma via mercantil cujo progresso continuava a ser, no entanto, confidencial.
Se a terra permite às tradições criarem raízes, foi o mar o teatro da formidável expansão que os séculos XVII e XVIII iriam imprimir ao comércio do chá. As companhias de navegação inglesa, francesa e holandesa desenvolveram todos os esforços para negociar, ao melhor preço, acordos com a impenetrável China e aí implantar os seus entrepostos. A história fervilha então com surdas manobras, povoa-se de personagens inquietantes e favorece o engenho.

Em 1849, Robert Fortune percorre a China de liteira, disfarçado de mercador chinês e depois de mandarim mongol, e espiona ao serviço de Sua Graciosa Majestade, furtando finalmente o segredo do fabrico do chá. Graças a ele, serão plantados vinte mil pés da «árvore do chá» nos contrafortes do Himalaia. Aclimatadas ao Ceilão (Sri Lanka), as plantas do Assam farão deste país a «ilha do chá».
No início do século XX, surge uma nova personagem, Thomas Lipton. A sua audácia - combinada com um sentido ímpar da comunicação - impele-o para Ceilão, leva-o a dispensar intermediários e a diminuir o preço do chá para o tornar acessível aos mais humildes.

_
Kitti Cha Sangmanee

0 comentários: